terça-feira, 29 de novembro de 2011

Sex in the Closet - 1º Capítulo





Maisha Vladislav
“Sinto você se excitar quando todas as coisas que ama odiar”


Palavras eram poupadas, os corpos ardentes completamente inebriados dispensavam qualquer outra forma de comunicação. Os lábios vagavam pela pele macia, explorando cada mínimo pedaço exposto. As mãos viajavam através das curvas bem formadas, ora acariciando, ora puxando, ou até mesmo arranhando. O sutil movimento dos corpos predizia aquilo que se encontrava expresso nos olhos das meninas desde que se viram pela primeira vez, minutos atrás. Por fim: A consumação, a explosão de prazer que acordava cada célula de seus corpos. Gemidos, que poderiam facilmente ser confundidos com gritos, escapavam dos lábios selados das protagonistas.
As sensações ainda povoavam suas veias. No entanto agora o foco eram seus pensamentos. Enquanto uma planejava segundos, e até mesmo terceiros encontros, a outra simplesmente arrumava sua roupa e jogava sua franja de um loiro tão intenso que chegava a hipnotizar para trás. Enquanto uma ensaiava palavras para iniciar uma conversa que jamais existiria, a loirinha ocupava-se em lhe dar as costas pronta para deixar o cubículo no qual se encontravam. Sentia a outra seguindo-a com os olhos, antes mesmo que ela pudesse argumentar algo, Maisha a cortou: - Não vai estragar tudo agora.

“You have seven more seconds to
Decipher your life
Before my tongue become a
Blade and your brain gets sliced
I warned you before
I’m addicted to war
I was praying for Armageddon
On the day I was born”

Reflexos de chamas ardentes brincavam nas íris douradas da loirinha. Recostada sob uma confortável poltrona do salão de espera do aeroporto de Berlin; ela brincava de fazer círculos com seu isqueiro de estimação. Movimentava o objeto ameaçando jogá-lo em algo, apenas pelo simples prazer de observar as pessoas encolherem-se ao seu redor. Nessas ocasiões um leve sorriso intimidador surgia no canto de seus lábios róseos. Acompanhou mais um movimento abusivo das chamas antes de perceber o olhar perfurador sobre si.

- Porque não estou surpresa de vê-la aqui – sua voz não passava de um sussurro. Seu corpo reclinou-se sobre a cadeira para apreciar o corpo escultural da recém chegada. Mordeu suavemente o lábio inferior antes de encontrar o mais gélido par de olhos que já havia encarado. – Olá, Dietricha – falou suavemente completamente detida em uma avaliação detalhada das íris esverdeadas da outra. Sabia que a ruiva também a avaliava. Pelo sorriso irônico que surgiu em seus lábios, também tinha certeza de que ela aprovava o que via. Embora conhecesse a ruiva a vida inteira, afinal eram primas, ainda surpreendia-se com a intensidade de sua comunicação. Não precisavam de palavras, ou gestos, apenas olhares.

Deteve-se naquele olhar por mais alguns segundos. Viu-se despida perante as íris esverdeadas, sentiu a intensidade do amor não pronunciado invadir suas veias de forma tão avassaladora que chegava a fraquejar-lhe. Sabia que passaria um longo período afastada daquelas sensações. Portanto desfrutou de cada uma delas longamente. Amargou o fel venenoso da saudade que corroia-lhe a alma. – Então, a gente se vê – falou simplesmente sentindo sua saliva descer por sua traquéia como o mais cruel dos venenos. Segurava-se para manter sua pose rebelde e indiferente, porém ali, tão próxima da pessoa com quem mais se importava, tornava-se quase impossível. Deu as costas à prima antes que não resistisse à tentação de abraçá-la carinhosamente e dizer-lhe como sentiria sua falta.

“Incite and Ignite
Cried my muse
Elevating IQ’s as I enter
The room
It’s elemental
Defying gravity with these
Lyrical miracles & street
Philosophies”

- Heinrich – sussurrou friamente ao aproximar-se da figura desalinhada a sua frente. Deixou que seus lábios reclinassem-se em uma rara amostra de sorriso, ainda que este não fosse completamente sincero. Sentiu seu corpo torna-se ligeiramente mais rígido ao ouvir o comentário do outro a cerca do futuro. Ele tinha medo do que viria. Era compreensível, a própria Maisha também o tinha, obviamente jamais o demonstraria. – Medo é para os fracos – resumiu-se a dizer recostando-se no assento do avião que a levaria ao seu destino. Inglaterra, passar quatro anos estudando na universidade de Liverpool. Daí por diante sua única companhia eram seus pensamentos torturantes.

Existe uma tênue linha que divide a fantasia da realidade. No entanto tal linha torna-se imperceptível quando se vaga pelo mundo do subconsciente. Ou melhor, quando se vaga pelas profundezas de si mesmo. E era aquilo que a loirinha fazia, mergulhava em si mesma, entorpecia-se com as sensações contraditórias que suas lembranças causavam-lhe. Ora sorria, ora ansiava por gritar, ou ainda chorar. Revisitou brevemente a área externa da casa de seu falecido bisavô, focou-se nos rostos de seus primos atribuindo-lhes valores de importância em sua vida. Sua família possuía incontáveis defeitos, mas ainda era tudo o que residia de bom em si.

O tempo voava e logo o avião pousava na Inglaterra. Passeou os olhos pela janela observando a pacata cidade universitária onde residiria pelos próximos anos. Toda a claridade advinda da paisagem cegava seus pequenos olhos, habituara-se a escuridão, ao inverno constante, afinal passara os últimos anos de sua vida em uma escola obsoleta no norte da Rússia. “Essa foi sua escolha,” recordou-se duramente antes de começar a se erguer para deixar o avião.

“Breathe in deep
A sea of desperate dreams
I have no mouth
I must scream”

- Ei... Toma cuidado com isso. Ela vale mais do que você vai conseguir ganhar a vida toda. – gritou com um dos funcionários da companhia aérea que quase derrubara sua preciosidade no chão. – Deixa eu mesmo levo... É impossível encontrar alguém competente nessa pocilga- exclamou irritada tomando o vidro retangular das mãos do ser imundo que quase derrubara Lili, sua cobra de estimação, pela segunda vez. Escutou os risos altos de Heinrich que comentava algo sobre como seria engraçado vê-la morar só naquele país. Respirou profundamente contando até mil, porque dez não era o suficiente, para acalmar se acalmar e não acabar ela própria derrubando seu bebê. – Há há há... Super engraçado- falou sorrindo ironicamente enquanto jogava o vidro nas mãos do outro – E não ouse derrubar... – falou calmamente, porém o tom de ameaça era explicito.
Caminhava pelo salão com o queixo erguido e as feições rijas conferindo-lhe uma expressão desafiadora. Com os olhos encobertos pelos óculos escuros encarava cada criatura daquele lugar. Depois de alguns minutos de procuras exaustivas finalmente seu olhar foi atraído por um local mais afastado onde encontrava-se uma moreninha de expressões brandas e uma ruiva de beleza estonteante. Encarou-as determinada por uma fração de segundos antes de aproximar-se. – Acho que já estamos atrasadas pra conhecermos nosso novo apartamento, não? – Embora soubesse que a praxe mandava que se apresentassem e falassem sobre como seriam ótimas amigas Maisha não gostava desse tipo de sentimentalismo, para ela as relações eram regidas por sua objetividade.
Escutou Heinrich resmungar e apresentar-se antes de dar um abraço apertado nas meninas “que gay” pensou. – Passaremos os próximos cinco anos dividindo um apartamento tempo não faltara para nos conhecermos. Agora realmente estamos atrasados – falou firmemente arrumando a gola de seu sobretudo negro antes de encarar profundamente seus colegas e seguir na direção do exterior do aeroporto. Não precisou olhar para trás para ter certeza que estava sendo seguida de perto pelos três companheiros.
Ergueu uma das mãos acenando para um taxi que passava, dentro de alguns minutos os quatro jovens já encontravam-se devidamente acomodados no interior do veiculo enquanto nossa loirinha trocava algumas palavras tensas ao telefone. Aparentemente houvera um problema na entrega de suas malas que deveriam ter chegado dois dias antes quando uma arquiteta decoraria o apartamento.


“- Der Wahnsinn-
Ist nur eine shmale Brücke
Die Ufer sind Verhunft und Trieb
Ich steig dir nach
Das Sonnenlicht den Geist verwirrt
Ein blindes kind das vorwärt kriecht
Weil es seine Mutter riecht“


Encarou o antigo prédio com determinação, analisando-o cuidadosamente, este possuía características barrocas de ótimo gosto. No entanto em estado de claro abandono, logo teriam que arrumar um lugar melhor, ou dar um jeito naquela situação. Afinal, uma Vladislav amiga da mais alta nata alemã e britânica não poderia morar em uma espelunca qualquer. Era verdade que sua renda havia sido cortada pela metade, mas ainda era uma Vladislav, e ainda possuía o melhor, e mais influente, ciclo de amizades.
Sorriu levemente ao lembrar-se do glorioso quarteto responsável pelas melhores festas da escola, e também por uma grande parcela de “maldade” existente na mesma. As mais belas e astuciosas jovens do Internato, juntas formavam algo tão tenebroso, quanto era desejável e, certamente, imbatível.
Voltou a encarar o prédio a sua frente e dedicou-lhe seu melhor olhar de asco antes de seguir para o apartamento que haviam alugado semanas antes. – Dá pra andarem rápido – falou ríspida para os futuros colegas de casa. Não era que a alemã fosse sempre fria e ríspida, mas nos últimos tempos vinha passando por consecutivos reveses que a faziam torna-se ainda mais gélida que o habitual.
A verdade é que ela estava apavorada, pela primeira vez na vida desafiara os pais e agora pagava o preço de tal ato. Em geral a loirinha acatava alegremente as ordens estabelecidas por seus progenitores, no entanto ao descobrir do envolvimento afetivo de sua mãe com um rapaz que poderia ser seu namorado e que seu pai não só sabia disso como aprovava ela não teve outra escolha se não deixar a mansão Vladislav, onde vivera desde que nascera.
Encarou durante alguns segundos a porta do apartamento 1501, para então destrancar a mesma e adentrar o pequeno, porém confortável, ambiente onde passaria os próximos anos de sua vida. Passeou os olhos por cada cantinho do local analisando cada detalhe com afinco. Soltou um breve suspiro de resignação antes de se virar para seus companheiros – então é isso... Estamos aqui... Conseguimos – falou sem emoção sentindo os braços de Heinrich envolver-lhe em um abraço carinhoso. 

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

O cônego - por Heitor

 “Vem do Líbano, esposa minha, vem do Líbano, vem...
As mandrágoras deram o seu cheiro.
Temos às nossas portas toda casta de pombos...”



A lua, em sua mais bela exibição, tinha sua luz refletida nas ondas do mar selvagem e excitante. Em um mausoléu afastado encontrava-se Heitor, recostado em sua janela espaçosa. Seus olhos, tão azuis quanto o reflexo da lua, completamente detidos em sua leitura: O cônego ou metafísica do estilo, de Machado de Assis. Suas mãos apertavam firmemente o papel, sua imaginação voava. A cada nova palavra, uma nova descoberta. Lia e relia... Sua concentração era tão intensa, que, por vezes, conseguia ouvir suas engrenagens cerebrais trabalharem em interpretações diversas. Divagava entre as palavras à sua frente e as diversas outras leituras que antecederam a mesma. Por um momento chegara a imaginar o que viria a seguir, mas logo voltava à atenção ao texto presente.

Parou, releu, raciocinou. Sua mente já trabalhava a frente, ou atrás, fazendo associações. Pelo canto de seus lábios róseos começou a surgir um sorriso. Lembrava--se vagamente de outro texto que lera pouco tempo atrás: “teorias e alegorias da interpretação no Theatrum de Michel Focault”, por Khalil. As sombras que cercavam sua imagem solitária pareciam modelar-se na escuridão, formando uma citação do texto lido: “O princípio da interpretação nada mais é do que o intérprete.” Através de sua janela o menino observou as copas das árvores bailarem formando uma nova citação. Dessa vez, de Paulo Freire: “Ler é reescrever o que estamos lendo. É descobrir a conexão entre o texto e o contexto do texto.”

Tomado pela surpresa, Heitor deu-se conta que era exatamente isso que fazia naquele exato momento. Por um instante, sua mente desprendeu-se das palavras de Machado, passando a divagar sobre as interpretações. Ora, se lhe era permitido associar o conto machadiano a teses interpretativas, não seria isso uma confirmação das teses interpretativas? Sim, seria! Mas, sem mais delongas, a atenção do nosso personagem voltou-se para a leitura decorrente. O sorriso voltou a brilhar em seus lábios ao reler sobre a tese criada por Machado. Em sua mente surgiam desenhos de um cérebro repartindo-se em diferentes pólos. As palavras penetravam sua mente e logo seu próprio cérebro começava a trabalhar, criando imagens de palavras que se entrelaçavam, casavam e até mesmo tinham filhos.

Mas, vamos com calma, (antes que o nosso personagem volte do mundo da lua), ou, seria do mundo das procriações? Explicar-lhe-ei a tese machadiana do “idílio-psíquico”. Os substantivos nascem do hemisfério direito do nosso cérebro, enquanto os adjetivos nascem do hemisfério esquerdo. Isso acontece devido ao fato das palavras serem divididas por sexo. Isso mesmo, por sexo! Mas por favor, caro leitor, não comece a imaginá-los tendo filhos. No entanto, vale ressaltar que sim! Elas amam umas as outras e encontram-se formando um casal.

Passada as devidas explicações, voltemos para o pequeno de olhos brilhantes que já avançava em suas leituras, iniciando um novo tour de divagações. Voltado para a lua, Heitor, passou a estudar insistentemente as formas de seus reflexos nas ondas desejosas. Embora, seu corpo estivesse voltado para tal cena, sua mente preocupava-se em analisar mais profundamente as palavras que já começavam a ser absorvidas.  - confesso que não.  - a sutileza machadiana pegara o menino de surpresa, e quando vira já estava falando com o texto. Pronto!!! A relação entre narrador e leitor estava estabelecida. Mas Heitor não estava satisfeito. Ele Queria saber mais, queria entender como era possível o texto comunicar-se com seu leitor. A resposta emaranhou-se por suas veias cerebrais e, mais uma vez, as sombras pareceram tomar formas, fazendo associar aquele momento com o texto de Khalil: “O discurso veicula e produz o poder; reforça-o, mas também o mina, expõe, debilita e permite barrá-lo”. Ora, se o discurso está relacionado ao poder, obviamente seus autores geram formas de manipulá-lo, visto que a interpretação depende inteiramente de seu intérprete. Tendo isso em mente, poderíamos dizer que ao produzir um texto, o autor delimita um determinado número de interpretações possíveis.

Ainda atordoado pela quantidade de informações despejadas em sua mente, Heitor titubeou, pensou em desistir. Mas sua curiosidade já havia sido aguçada e agora só lhe restava concentrar-se e concluir a leitura. Logo, a mente do menino voltava a divagar e uma nova cena ganhava espaço em sua imaginação. De um lado, um substantivo ganhava braços, pernas e é claro, boca. Do outro, um adjetivo ganhava os mesmos atributos, porém com algo a mais: um vestido. O substantivo já não era substantivo e sim Silvio. O adjetivo, por outro lado, virou Silvia. E assim, ambos, Silvio e Silvia, bailavam a procura um do outro. O barulho os atormentava, tornando sua comunicação quase impossível. De repente. O silêncio. Silvio avistou Silvia, e, esta, correu em sua direção. Juntos, bailaram através dos olhos de Heitor, que já começava a balançar a cabeça, agitando seus fios avermelhados, tamanha a confusão.

E o cônego? Perguntava-se Heitor ao final da leitura mirando seu título curiosamente. Repassou, mentalmente, todos os momentos do conto. O cônego estava escrevendo, foi interrompido para fazer um discurso e... Silvio e Silvia dominaram a cena. Como se uma luz se acendesse em sua mente ele percebeu o que agora lhe parecia óbvio. O cônego não passava de uma artimanha utilizada por machado para que pudesse lançar as bases de sua nova psicologia. Mas vamos com calma! Se Machado utilizou-se de um escritor enquanto este escrevia, para falar do processo de escrita, isso não seria metalinguagem? Obviamente, meu caro leitor. Eis a magia do texto machadiano. 

sábado, 5 de março de 2011

Anotações de uma mente perturbada...




Hoje eu preciso dizer o que sinto, por que meu peito explode em reclames gritando aquilo que minha voz precisa calar. Alguém me disse que o perigo, ou melhor, o proibido, é mais prazeroso, talvez essa pessoa tivesse certa. No entanto, em minha opinião, o amor não pode, nem deve, ser proibido, porque não existe formas de calar o coração, não tem como negar aquilo que o corpo demonstra em cada gesto, ainda que inconsciente. Hoje eu preciso calar a razão pertinente a minha alma, hoje eu preciso declarar meu amor, hoje eu preciso esquecer o mundo. Imersa nas águas turbulentas do mar sinto o silêncio marítimo invadir meus tímpanos fechando-me no mundo da minha mente. Paz, tranqüilidade, idéias, músicas, poemas, tudo tem seu espaço torturante nas vielas de conhecimento atordoado de meu cérebro... Fragmentos de uma realidade perturbada e inconstante... As ondas vão e vem batendo na rocha bruta, gélida, consistente, invariável... Pensamentos, sonhos, ideais, paixões, desejos... É tudo relativo, inconstante, variável, ao contrário da bruta rocha com a qual batem de frente... Um ciclo vicioso ironicamente estável no meio do caos de tudo isso.